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A IRMÃ DE LEITE DA PRINCESA



romance publicado todos os domingos em episódios sequenciais
autor: Jorge Francisco Martins de Freitas

Episódio 26

Em 1885, é celebrado o Tratado de Simulambuco, colocando Cabinda sob protetorado português; surge o movimento monárquico Vida Nova, pugnando pelo envolvimento do rei na política e nas decisões do Estado; é inaugurado, em Lisboa, o elevador da Glória e a escola secundária Maria Amália Vaz de Carvalho e entra ao serviço a estação ferroviária de Coimbra.

D. Fernando II e sua segunda esposa, Elise Hensler

A 15 de dezembro, morre D. Fernando, segundo marido da Rainha D. Maria II. Havia casado, em 1869, em segundas núpcias, com Elise Hensler, uma cantora de ópera solteira que já possuía um filho, provocando um grande mal-estar na corte portuguesa.

Como herança, deixa à esposa o Palácio da Pena, por si mandado construir com recursos próprios.

D. Carlos e D. Amélia

No início de 1886, D. Carlos, na altura com 22 anos de idade, apresenta um atraente aspeto físico. As raparigas que com ele contactam ficam encantadas com os encaracolados cabelos louros e as rosadas e arredondadas faces que este possui, sempre iluminadas por um expressivo sorriso.

Várias princesas são selecionadas pela corte para com ele se casar, acabando a escolha por recair sobre Amélia de Orleães, filha primogénita de Conde de Paris, pretendente ao trono de França.

Maria Isabel já deixou de ser perceptora do príncipe herdeiro, mas continua muito próxima deste, sempre disponível para o aconselhar e escutar as suas confidências.

— Anseio pela chegada de Amélia! – desabafa o príncipe.

— A corte tomou uma boa decisão ao escolhê-la como sua futura esposa – responde Maria Isabel. — A maioria dos monarcas só conhece a noiva na véspera do casamento, mas, no caso de Vossa Alteza, ela já lhe foi apresentada durante o nosso périplo pela Europa

— Recordo-me perfeitamente dela! – confirma o príncipe. – É muito bela!

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A 18 de maio, D. Carlos e a sua comitiva, constituída pela Marquesa de Marinhais e outros elementos da nobreza, partem para a Pampilhosa, onde pernoitam.

No dia seguinte, dirigem-se à estação dos caminhos de ferro, a fim de aguardarem a chegada de D. Amélia de Orleães e do seu numeroso séquito, constituído, entre outros nobres, pelos pais e irmãos da noiva.

Numerosos populares estão presentes na gare, aplaudindo entusiasticamente D. Amélia assim que esta desce da carruagem.

D. Carlos cumprimenta a noiva, notando um único senão nela: é ligeiramente mais alta do que ele…

As duas comitivas almoçam no restaurante da gare ferroviária, seguindo posteriormente para Lisboa, no comboio expresso.

Chegam à estação de Santa Apolónia, profusamente engalanada, às cinco horas e vinte minutos da tarde. Todos os restantes elementos da família real já ali se encontram, envoltos por inúmeros lisboetas desejosos de saudar a futura esposa do príncipe D. Carlos.

D. Amélia, elegantemente trajada com uma vistosa toilette parisiense azul e branca, as cores nacionais da monarquia portuguesa, recebe as boas-vindas, dirigindo um luminoso sorriso para todos os presentes.

Feitas as apresentações, saem da gare, onde já se encontram doze landaus descobertos para transportar toda a comitiva para o Palácio das Necessidades.

A Marquesa de Marinhais, acompanhada de outros três nobres, ocupa a antepenúltima carruagem. Na penúltima, seguem a Rainha D. Maria Pia, a princesa D. Amélia, o príncipe D. Carlos e o conde de Paris; e, na última, o rei D. Luís I, a condessa de Paris, a princesa de Joinville e o duque de Aosta.

O Cortejo, precedido de um piquete de cavalaria, segue lentamente pelas ruas de Lisboa, suscitando a curiosidade e o aplauso da população. Durante o percurso, todos os edifícios do estado e alguns de particulares apresentam-se engalanados.

O casamento é celebrado três dias mais tarde, na Igreja de São Domingos, iniciando um período de festejos populares.

Os nubentes ficam instalados no Palácio de Belém, onde recebem, com regularidade, a visita da Marquesa de Marinhais. Entre esta e D. Amélia estabelece-se uma grande amizade, levando a futura rainha a confidenciar-lhe, em francês, pormenores íntimos sobre o seu casamento:

— Gosto muito do meu marido. Ele é muito gentil comigo. Imagine que, na nossa noite de núpcias, soube vencer a minha timidez com palavras e carícias.

Michel Laurent

Numa das visitas ao palácio de Belém, D. Amélia apresenta a Maria Isabel o seu médico pessoal Michel Laurent, primo do Duque de Montpensier. Viera para Lisboa na comitiva que acompanhara D. Amélia, tendo aberto um consultório na zona do Chiado, onde rapidamente adquire uma vasta clientela. No período da manhã, atende a alta sociedade lisboeta e, da parte da tarde, as camadas mais modestas da sociedade, disponibilizando os seus serviços por um valor simbólico.

Dois anos mais novo que a Marquesa de Marinhais, ocupa o tempo livre escrevendo poemas. A sensibilidade que empresta aos seus escritos encanta Maria Isabel, levando-a a convidá-lo para estar presente nos serões culturais que organiza em sua casa.

Entre ambos começa a surgir uma amizade profunda, que, em breve, se transforma num encantador relacionamento amoroso.

Mais uma vez, Maria Isabel é confrontada com o velho problema de recear que este pretendente apenas procure usar, em benefício próprio, a fortuna que ela detém, o que a inibe de concretizar, de ânimo leve, um eventual casamento.

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No decorrer de 1886, é constituído o 41.º governo da Monarquia Constitucional, presidido por José Luciano de Castro; surge, em Lisboa, o Instituto de Agronomia e Veterinária; é inaugurado o farol de Cacilhas, o farol da Ínsua, na foz do rio Minho e o farolim de Felgueiras, na margem direita do rio Douro; entra ao serviço a ponte D. Luís no Porto e a ponte Internacional de Tui, ligando esta cidade espanhola a Valença; e a CP é apetrechada com novas locomotivas das séries E81 a E86.

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A 17 de fevereiro de 1887, Maria Isabel faz 42 anos de idade. Se protelar por mais tempo um eventual casamento, arrisca-se a ultrapassar a idade de ter descendência, pelo que propõe ao médico um contrato pré-nupcial, nos termos do qual este desiste, após o casamento, de tomar posse dos bens que esta possui. Aquando da morte da marquesa, caso não existam filhos em comum, o património dos Marinhais será entregue ao Diogo, seu meio-irmão.

Profundamente enamorado pela marquesa, que se transformara na musa inspiradora dos seus poemas, o clínico, que sempre vivera despegado do dinheiro, aceita este compromisso de imediato, começando a ser preparado o casamento.

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A 21 de março, às nove horas da noite, nasce o príncipe Luís Filipe, filho de D. Carlos e D. Amélia.

Lisboa inteira é surpreendida pelo estalido de numerosas girandolas de foguetes, anunciando a feliz ocorrência. Passados alguns minutos, o troar da artilharia participa igualmente nesta festividade.

Inúmeros populares dirigem-se, de imediato, para os paços de Belém, entoando vivas aos felizes pais e ao seu rebento, a quem, por nascimento, é atribuído o título de príncipe da Beira e duque de Barcelos.

Nessa noite, numa das salas do palácio, Luís Filipe é batizado pelo cardeal-patriarca de Lisboa.

O programa oficial das festividades prevê um Te-Deum oficial na Sé, uma receção no Paço da Ajuda e uma récita de gala no Teatro de São Carlos.


© Jorge Francisco Martins de Freitas, 13-11-2022.
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