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modas e bordados

Pegue na agulha e borde...
um LENÇO DE NAMORADOS

Texto de Maria Luísa V. de Paiva Boléo



A versão inicial deste texto foi publicada na revista Notícias Magazine de 14 de Fevereiro de 1999.

A presente versão, revista pela autora, foi introduzida no Portal sem fins lucrativos O Leme, em 6 de fevereiro de 2006 e no Magazine sem fins lucativos O Leme de janeiro de 2020.

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Desde sempre, os portugueses partiram: ou para ganhar o sustento noutro lugar, ou para a guerra, ou para embarcarem em navios na aventura da Expansão. Em casa ficavam as mulheres e as crianças. Mulheres sós, tristes, que trabalhavam a terra, fiavam o linho, amassavam o pão e iam vivendo de esperança. Ora, na hora da despedida, em certas regiões do norte de Portugal, era “obrigatório” a rapariga apaixonada oferecer um lenço ao namorado. Lenço bordado por ela, com uma quadra da sua autoria. Se bordava com erros ortográficos, isso era pormenor insignificante, o que contava - e conta - são os sentimentos. Depois dos abraços e beijos de despedida, o rapaz levava algo que lhe faria lembrar a amada distante. Este lenço era como uma carta, mas mais bela e quase indestrutível, bordada em linho fino, no qual - quem sabe! - algumas lágrimas masculinas cairiam nos momentos de maior tristeza. As cores e as quadras desses lenços são das coisas mais bonitas do nosso património artesanal bordado, pela sua autenticidade e ternura. É principalmente na região do Minho que esses “lenços de namorados” têm a sua mais bela expressão. Houve-os bordados apenas a branco ou a negro, mas os mais comuns têm muitas cores e há desenhos “obrigatórios”. Nessa linguagem secreta, fique a saber que rosa quer dizer mulher, coração é amor, lírios simbolizam a virgindade, cravos vermelhos são sinónimo de provocação, e os pombinhos significam os namorados como não podia deixar de ser. Isto, só para fazermos uma breve ideia destes sinais de amor, pois há muitos mais.

Para quem nunca viu esses “lenços de namorados” é preciso aprender a lê-los porque não se sabe onde começa e onde acaba a quadra.

Nos lenços que aqui apresentamos deixamos às leitoras e leitores mais apaixonados essa tarefa. Não desistam à primeira.

Já está convencida, mas falta-lhe inspiração? Deixe estar que O Leme ajuda-o a encontrar as palavras certas para exprimir o seu amor...

Felizmente temos as nossas “fontes”, que o património cultural escrito que se pode arquivar (hoje em espaços pequenos, devido aos avanços da informática) não desaparece e vai sendo preservado. Os textos que estão em livros podem sempre ser transpostos para materiais duradouros. As quadras de amor não estão ao relento, por isso ainda vão perdurar certamente por muitas e muitas gerações. Aqui ficam algumas quadras de Amor, retiradas do Cancioneiro Popular, coligido por J. Leite de Vasconcellos.

A carta que eu te escrevo
Sai-me da palma da mão
A tinta sai dos meus olhos
E a pena do coração.

Escrevia-te uma carta
Se tu a soubesses ler,
Mas tu dá-la a ler a outrem,
Tudo se vem a saber.
A carta que me escreveste
Inda não ia acabada
Faltava-le pôr no meio
Uma rosa encarnada.

Cartas de amor são mentiras
E amores mentiras são;
Mentira foi teu amor
Que enganou meu coração.

Escreve-me, amor, escreve.
Lá do meio do caminho;
Se não achares papel,
Nas asas de um passarinho



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